A INTRUSA
CAPÍTULO 07
UMA NOVELA DE TAÍS GRIMALDI
CENA 1. MANSÃO DOS GODOY BUENO. FACHADA. EXT. DIA
O sol brilha sobre a fachada imponente da mansão, mas o clima entre os personagens está longe de ser leve. Vivi, ainda encarnando Carolina, caminha em direção à entrada com passos firmes, mas o rosto denuncia o abalo. Seus olhos buscam disfarçar a inquietação causada pela mensagem ameaçadora que acabara de ler.
Marco Aurélio se aproxima, já com a chave do carro em mãos. Ele a observa por um instante, atento ao seu semblante tenso.
MARCO AURÉLIO - (SUTIL, MAS DIRETO) Aconteceu alguma coisa? Você tá estranha.
Vivi respira fundo, sorri com esforço, e responde no seu tom debochado, com o pajubá afiado que escolheu como escudo.
VIVI - Nada, amor. Só tô virada do babado mesmo. Madrugada foi intensa.
Marco Aurélio arqueia uma sobrancelha, hesita por um momento, mas não insiste.
MARCO AURÉLIO - Certo. A gente sai pra São Paulo em meia hora. Não demora.
Ele segue para o interior da casa. Vivi permanece por um instante parada na entrada. O sorriso se desfaz assim que ele vira as costas. Ela olha para o carro novamente, como se o fantasma de uma decisão a espreitasse.
O vento sopra leve. E com ele, um pressentimento silencioso.
CORTA PARA:
CENA 2. MANSÃO DOS MONTESINOS. SALA DE JANTAR. INT. DIA
A manhã entra pela ampla janela de vidro, iluminando a sala com delicadeza. Cecília, impecável em seu robe claro de seda, toma o café da manhã com serenidade. Os gestos são suaves, mas seu olhar está distante, como se as nuvens do pressentimento ainda pairassem.
Carlos entra, vestindo uma camisa ainda amarrotada, tentando parecer tranquilo. Ela o observa por cima da xícara.
CECÍLIA - (VOZ DOCE, MAS COM A PONTADA DE QUEM SABE ONDE CUTUCAR)
Você chegou tarde (PAUSA) Ou nem chegou?
Carlos força um sorriso, senta-se.
CARLOS - O plantão estourou o horário. Emergência. Não consegui avisar.
Ela não rebate. Apenas coloca a xícara sobre o pires com elegância, como quem coloca um ponto final numa frase subentendida.
CECÍLIA - (SUAVE, MAS FIRME) Claro. Sei que um hospital pode ser tão imprevisível quanto o amor.
Carlos engole seco, desvia o olhar. Pega a xícara com a mão levemente trêmula.
CECÍLIA - (APROXIMA-SE, O TOM MUDA) Vou sair mais cedo hoje. Tenho uma cesárea. (BEIJA-O NA TESTA COM TERNURA CONTIDA) Tente dormir um pouco. Você parece desgastado.
Ele apenas assente. Cecília caminha em direção à porta, mas antes de sair, vira-se para ele.
CECÍLIA - (SUTILMENTE ENIGMÁTICA) Ah Carlos. (PAUSA) Só não me trate como boba. Eu não mereço isso.
Ela sorri com doçura e sai. Carlos permanece imóvel, o café esquecido nas mãos. O silêncio da sala pesa como um segredo mal escondido.
CORTA PARA:
CENA 3. PALÁCIO TANGUARÁ. SUÍTE DE LAURA. INT. DIA
A suíte é luxuosa, minimalista, com vista para o verde do parque. Laura, envolta em um robe de seda negro, toma café da manhã sozinha. A bandeja é impecável. Ao lado, um iPad, um frasco de remédio caro, e uma foto antiga de Roberto, emoldurada em prata.
Ela pega o celular. Um toque. Tela dividida com Marcelo, de pé diante da imponente Catedral de São Pedro, em Gramado. Neve leve cai ao fundo. Ele está elegante, mas cansado.
LAURA - (FRIO E INCISIVA) Acordado a essa hora? Que milagre. Achei que estivesse em alguma adega se lamentando com Pinot Noir.
MARCELO - (SERENO, QUASE CÍNICO) Bom dia, Laura. Não estamos todos de luto? Só escolho o meu jeito de sofrer com mais sabor.
LAURA - (CORTANTE, SEGURA) Quero o dossiê sobre a Carolina. Hoje. Sem desculpas, sem retórica de advogado frustrado.
Marcelo suspira, ajeitando o cachecol.
MARCELO - Estou no sul exatamente por isso. Alguém viu algo naquela noite. Você vai ter o que quer antes do pôr do sol.
Laura bebe um gole de café. Seu olhar é gélido.
LAURA - (BAIXINHO, MAS COM FORÇA) Ontem eu estive a meio metro dela, Marcelo. A assassina do meu marido, rindo, cercada de gente, viva. (PAUSA, AMARGA) Sabe o que é ter que segurar a mão trêmula pra não arrancar a máscara de uma falsa viúva?
MARCELO - (NERVOSO) Laura, não...
LAURA - (INTERROMPE, COM VENENO CONTIDO) Cale a boca. (BAIXA O TOM) Você ainda tá jogando xadrez emocional com ela. Eu não. Eu sou guerra. E guerra exige precisão. (PAUSA DRAMÁTICA) Ela não matou Roberto diretamente, mas foi a denúncia dela que o fez puxar o gatilho, Marcelo (PAUSA)ela vai pagar por isso.
Ela encerra a ligação com um leve toque. Permanece imóvel. Olha para a foto de Roberto com ternura sufocada.
LAURA - (VOZ BAIXA, QUASE NUM SUSSURRO PARA SI MESMA) Eu te juro, ela vai sentir tudo que eu senti. Em dobro.
CORTA PARA:
CENA 4. MANSÃO DOS GODOY BUENO. FACHADA. EXT. DIA
O sol bate forte na entrada da mansão. Marco Aurélio e Vivi (ainda como Carolina) estão próximos ao carro, prontos para partir. Vivi usa óculos escuros e tenta manter a pose, mas está visivelmente tensa. Marco confere o porta-malas, distraído.
De repente, um carro importado surge em alta velocidade e freia bruscamente. Lívia, impecável num tailleur bege claro, salta do carro com passos decididos.
LÍVIA - (SORRISO SOCIAL, QUASE AUTOMÁTICO) Bom dia.
Marco acena com a cabeça, educado.
MARCO AURÉLIO - Vamos sair agora. Te vejo em São Paulo?
LÍVIA - Claro. Tenho umas coisas pra resolver antes, mas nos vemos lá. (OLHA DIRETAMENTE PARA VIVI)
Ela se aproxima de Vivi e a abraça num gesto performático. Durante o abraço, sussurra no ouvido dela, gelada.
LÍVIA - (VOZ BAIXA, AFIADA) Você vai pagar caro por ontem à noite.
Afasta-se com um sorriso largo, como se nada tivesse acontecido. Volta ao carro com elegância, entra e parte em alta velocidade, deixando um rastro de tensão no ar.
VIVI - (SEM TIRAR OS ÓCULOS ESCUROS, PARA SI MESMA) Que delícia de família.
CORTA PARA:
CENA 5. APARTAMENTO DE LARI PACOTÃO E VIVI VENENO. SALA. INT. DIA
Sala bagunçada, mas estilosa. Almofadas espalhadas, lambe-lambes na parede, incenso queimando. LARI PACOTÃOe NANNY WHO estão largadas no sofá, tragando cigarros com ar blasé. A TV está ligada em um reality show com o volume baixo.
NANNY WHO - (CURTINDO O CIGARRO) E a Vivi? Sumiu no mapa, né?
LARI PACOTÃO - (BUFANDO A FUMAÇA) Mona ela se meteu com rica de novela das oito. Tô esperando dar merda faz dias. Mas tá quieta demais, viu?
NANNY WHO - Pois se prepara, que eu tenho babado. (SORRI, SACANDO UM TABLET DA BOLSA) VOCÊ foi escalada pra animar uma festa na Mansão Santa Teresa. Só gente fina, elegante e sincera. Uns VIPs de fazer a Anitta suar frio.
LARI PACOTÃO - (LEVANTA A SOBRANCELHA, INTERESSADA) Ricaço com grana e champa rosé? Tô dentro, more. Já vou separar a lace diamante e a cinta nova.
NANNY WHO - E ó (PAUSA) vê se fatura, hein? (PISCA, CÚMPLICE) A crise tá braba, mas você tem talento pra sair de lá com Pix, presente e recibo emocional.
LARI PACOTÃO - (FAZ POSE, DEBOCHADA) Amor, eu não vou pra servir canapê. Eu vou pra mudar de vida.
As duas caem na gargalhada. Nanny apaga o cigarro no pratinho de cerâmica enquanto Lari já começa a procurar looks no celular.
CORTA PARA:
CENA 6. TEATRO MUNICIPAL. PALCO. INT. DIA
O palco vazio ecoa leve, com o som distante de passos de ensaio. A luz suave vaza por entre as cortinas. Madson está sentada no chão, ajustando a sapatilha de ponta com mãos trêmulas. Ela tenta se concentrar, mas os olhos revelam que a cabeça está em outro lugar.
Rudolfe se aproxima com um buquê simples e um sorriso ensaiado.
RUDOLFE -(LEVE, TENTANDO SOAR CASUAL) Hoje é dia de pas de deux, mas à noite, que tal um jantar só nosso? Como nos velhos tempos. Velas. Pinot noir. Você e eu.
MADSON - (FINGE UM SORRISO) Soa clássico.
RUDOLFE - (AJOELHA-SE AO LADO DELA, INTENSO) Você anda distante. Eu sinto. Mas eu tô aqui, Madson. Não precisa carregar tudo sozinha.
MADSON - (FOGE COM O OLHAR, SE LEVANTA) Então me ajuda a não tropeçar. (MAIS SECA) No palco.
RUDOLFE - (UM POUCO FERIDO, MAS TENTA MANTER O CHARME) Te vejo mais tarde, bailarina.
Ele sai. A porta do teatro se fecha com um eco sutil. Madson permanece imóvel, os ombros encolhidos. Respira fundo. O ar parece pesar em volta dela.
Lentamente, abaixa a cabeça. Uma lágrima cai, silenciosa. O medo está ali — sob o coque firme, o delineado perfeito e a postura de quem nunca erra o passo.
CORTA PARA:
CENA 7. RIO DE JANEIRO. ANOITECER. EXT.
SONOPLASTIA - "PADAM PADAM" - KYLIE MINOGUE
A tela se abre com um plano aéreo deslumbrante, capturando o calor dourado do entardecer. O céu, tingido de tons quentes, muda conforme a câmera se desloca de São Paulo para o Rio de Janeiro.
A câmera sobe, suavemente, atravessa o céu e se desloca, rumo à Baía de Guanabara, onde o cenário muda. O mar brilha em tons prateados, refletindo as últimas luzes do dia. O Cristo Redentor se ergue imponente, de braços abertos, sobre a cidade que começa a se preparar para a noite.
O Rio agora se revela em toda sua beleza. As ruas da Lapa começam a se iluminar, com seus arcos históricos contrastando com os modernos arranha-céus. O fluxo do mar, a dança da cidade, tudo se mistura numa harmonia de vida, energia e promessa.
CORTA PARA:
CENA 8. MANSÃO SANTA TERESA. PISCINA. EXT. NOITE
SONOPLASTIA - "PADAM PADAM" - KYLIE MINOGUE
A festa está no auge. Luzes pulsantes iluminam o ambiente, refletindo na água da piscina, criando uma atmosfera de luxo e excitação. A música ecoa pelas paredes da Mansão Santa Teresa, onde corpos dançam ao ritmo envolvente da música. Pessoas ricas, elegantes e desinibidas aproveitam a noite, suas risadas e conversas se misturando com o som vibrante da pista de dança.
Lari Pacotão chega à festa, radiante e com um look arrasador, que chama a atenção de todos ao seu redor. Seus passos são confiantes e calculados, seu sorriso, um mistério encantador. Ela se move entre os convidados como uma estrela em pleno brilho, seu charme ofuscando até os mais poderosos presentes.
No centro do cenário, Armand observa Lari à distância. Seus olhos se cruzam por um instante, e o clima fica tenso, como se uma faísca de atração estivesse prestes a acender. Ele se aproxima, seus movimentos rápidos, mas controlados, até estar ao seu lado. Ele sorri, cheio de intenções, e tenta beijá-la, mas Lari se esquiva com um sorriso enigmático, sua atitude de mistério ainda mais provocante.
LARI - (OLHAR DESAFIADOR, COM LEVEZA) Ah, querido (SORRI) Eu sou um pouco mais difícil de conquistar.
Ela recua com graça, o sorriso se mantendo, enquanto Armand parece hesitar, intrigado, mas claramente interessado.
A música de Kylie Minogue continua, com o som suave de "Padam Padam" marcando o ritmo, enquanto a cena continua a se desenrolar na festa — uma dança de aproximação e fuga, onde o desejo e o jogo de poder estão no ar.
CORTA PARA:
CENA 9. MANSÃO DOS GODOY BUENO. SALA. INT. NOITE
A porta se abre. Marco Aurélio entra primeiro, seguido por Vivi, ainda fingindo ser Carolina. O ambiente está iluminado com sofisticação. O silêncio da mansão é quebrado por um som leve de passos correndo.
Aurora, animada, surge no topo da escada e desce às pressas, correndo em direção a eles.
AURORA - (MUITO FELIZ) Mamãe! Papai!
Vivi se agacha e a abraça com ternura, pegando-a no colo num gesto espontâneo e amoroso. Marco Aurélio observa, surpreso com a doçura genuína daquele abraço.
MARCO AURÉLIO - (BAIXO, INTRIGADO) Você nunca foi tão carinhosa assim com ela.
Ana Maria, a babá venezuelana, surge discretamente à porta, segurando um brinquedo.
ANA MARIA - (SOTAQUE SUAVE, GENTIL) Ay, senhorita (PAUSA)tão dulce hoje (SORRI) parece até otra persona.
Vivi sorri, mantendo o disfarce com charme.
VIVI - (AFETUOSA, COM O TÍPICO PAJUBÁ DISFARÇADO) É que hoje eu tô plena, mona. Pleníssima.
O som de saltos na madeira interrompe o momento.
Valquíria, imponente, desce a escadaria lentamente, como uma matriarca de tragédia grega. Seu olhar é cirúrgico, sua ironia, afiada.
VALQUÍRIA - (SARCÁSTICA, VENENOSA) Espírito maternal?
Ou ela ganhou o Troféu Imprensa de Melhor Atriz (DEBOCHA) Ou essa aí não é minha nora.
Corte seco no rosto de Vivi, mantendo o sorriso, mas com o olhar ameaçado.
O clima pesa. Marco Aurélio finge não ouvir.
Aurora, no colo, a abraça mais forte.
CORTA PARA:
FIM
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